Se você trabalha em um laboratório, provavelmente já ouviu falar dos materiais de controle, nome técnico dos materiais de referência, conhecidos simplesmente como “controles”. Eles são peças fundamentais na “Jornada do Controle Interno da Qualidade (CIQ)”, um sistema composto por nove etapas para garantir que os processos analíticos funcionem corretamente e que os resultados sejam entregues com segurança.
A jornada do CIQ é um material em formato PDF que mostra de forma clara e simples as etapas necessárias para enfrentar os desafios do controle interno da qualidade, como validar o controle diariamente, realizar análises críticas corretamente, aplicar regras múltiplas e gerenciar a equipe e a rotatividade de pessoal.
O Material de Controle é a terceira etapa desta jornada e é sobre ele que vamos falar neste artigo. Mas caso ainda não conheça as outras etapas, você pode baixar nosso PDF clicando aqui e ter acesso a todas as informações necessárias para seguir a jornada do CIQ com sucesso.
Agora, vamos nos aprofundar no assunto e entender por que os materiais de controle são tão importantes para a qualidade dos resultados do laboratório.
A ideia é simples: se os resultados do material de controle estiverem dentro dos limites aceitáveis, então podemos ter confiança de que os resultados obtidos na amostra dos pacientes também estão corretos. Por isso, é essencial avaliar o desempenho dos materiais de controle com métodos estatísticos, como o Gráfico de Levey-Jennings e as Regras de Westgard, antes de liberar os resultados das amostras dos pacientes.
Mas como escolher os materiais de controle e usá-los da forma mais adequada?
Vamos falar dos aspectos críticos dos materiais de controle no aprimoramento do Controle Interno da Qualidade (CIQ), desde a seleção até a utilização diária. Vamos abordar as seguintes etapas:
O material de controle ensaiado é o mais comum no Brasil. Ele vem com especificações de quais analitos deve controlar, com valores de média e faixa de variação sugerida. Porém, a referência de intervalo não é adequada para o controle interno estatístico, que requer como parâmetro para estabelecer limites, o Desvio Padrão (DP).
Os valores do fabricante devem ser utilizados apenas na fase inicial, até que sejam levantados os valores próprios de aceitação do laboratório, as chamadas “médias próprias”. Fazer o controle interno com valores de bula não é considerado uma boa prática, pois é pouco sensível para detecção de erros e possibilita poucas avaliações que são necessárias para se fazer o bom controle.
Já o material não ensaiado, é fornecido sem os valores de média e de DP (ou às vezes a faixa) pelo fabricante. Pode ser usado de forma semelhante ao ensaiado, determinando-se previamente os valores do laboratório (médias próprias) e adotando-se a partir de então os limites para o gráfico de Levey-Jennings. O uso de material não ensaiado ainda não é comum no Brasil, mas traz vantagens porque teria custo menor que o ensaiado.
Existem dois aspectos de estabilidade dos materiais de controle: A garantida pelo fabricante e a que depende do usuário. Para garantir que o material cumpra o seu papel como referência para o controle, é importante observar as condições de armazenamento e uso do produto.
Para manter a estabilidade, devemos prestar atenção aos seguintes itens:
A reconstituição do controle liofilizado é um processo crítico e deve ser feita com equipamentos e solventes de qualidade para manter o material de controle estável. A falta de padronização pode levar a variações nos resultados dos controles, afetando a precisão das análises. Recomenda-se seguir as instruções do fabricante e utilizar pipetas volumétricas classe A, ou outro instrumento igual ou mais preciso, e água deionizada tipo reagente.
Fracionar os materiais de controle para armazenamento preserva a estabilidade do produto integral, especialmente para materiais armazenados congelados. As alíquotas devem ser mantidas sempre bem vedadas, nas condições especificadas pelo fabricante. As frações mantidas em recipientes com vedação incorreta sofrem os efeitos da concentração por evaporação do solvente. Para obter a estabilidade preconizada pelo fabricante, as temperaturas de armazenamento devem ser rigorosamente respeitadas.
O congelamento de diferentes preparações deve ser garantido de acordo com a temperatura recomendada pelo fabricante. A aparência de congelamento apenas, em temperaturas maiores que as recomendadas, não garante a preservação das características do material. O uso de recipientes adequados, criotubos, é muito importante para a preservação do material congelado. Outros recipientes não garantem a integridade do material.
O processo de descongelamento das amostras deve ser feito sem aquecimento, pois pode acelerar a degradação de algum componente. As amostras devem ser homogeneizadas após o descongelamento, evitando a agitação excessiva e o uso do vórtex. Deve-se garantir a inclusão de algum gelo que tenha permanecido na tampa. Só destampar quando a homogeneização estiver completa.
Antes de transferir uma amostra para o analisador, é importante garantir a sua homogeneidade. A presença de bolhas de ar na amostra pode levar a resultados incorretos, com erros do tipo aleatórios (violação de regras 1:3s e R:4s).
As amostras mantidas destampadas estão sujeitas ao processo de evaporação, o que pode aumentar as concentrações dos analitos. Ambientes bem ventilados e/ou com ar condicionado propiciam a concentração da amostra por evaporação do solvente. A corrida analítica deve ser iniciada tão logo os controles sejam destampados e colocados nas cubetas do analisador.
Em resumo, a estabilidade dos materiais de controle é um aspecto crucial para garantir a confiabilidade dos resultados obtidos nos testes analíticos.
É importante lembrar que a falta de cuidado nos processos envolvendo os materiais de controle pode levar a variações nos resultados, afetando a precisão das análises. Vamos falar mais a respeito nos tópicos a seguir…
Para garantir a estabilidade e a precisão dos materiais de controle utilizados no laboratório, é importante manter a consistência dos valores em frascos do mesmo lote. Para isso, recomenda-se adquirir um grande volume de um mesmo lote, suficiente para seis meses ou mais. Isso se justifica por ser fator de redução de custos, por dispensar a necessidade de se realizar com frequência a fase em preparo (médias próprias do laboratório).
A reconstituição de cada frasco deve seguir rígido padrão, realizada com o máximo de cuidado, evitando assim que se perca uma característica do produto, dada pelo fabricante, que é a pouca variação de frasco para frasco.
No planejamento do CIQ o laboratório deve considerar que é importante monitorar seu sistema para que seja estável no monitoramento de concentrações em níveis de interesse clínico. Em química clínica, são empregados na maioria das vezes, dois níveis, sendo um no intervalo de referência do normal e o outro no nível patológico.
Desenvolver o CIQ com no mínimo dois níveis possibilita maior sensibilidade do método para detecção de não conformidades, além de maior eficácia no momento de apontar o tipo de erro e a causa raiz.
Um material de controle pode apresentar diferentes resultados dependendo das substâncias incluídas em sua composição e das metodologias utilizadas na medição. Isso se deve aos efeitos da matriz utilizada, aditivos incorporados e outros processos utilizados em sua produção.
O ideal é que o material de controle tenha a mesma matriz que a espécie a ser testada. O efeito da matriz não pode ser removido, mas seu impacto pode ser minimizado quando o laboratório determina seus próprios valores de referência. Isso reforça a importância do laboratório determinar seus próprios parâmetros de média e limites e não utilizar a faixa do fabricante como referência para julgar seus sistemas.
Segundo a RDC 302, o laboratório pode utilizar amostras controle comerciais, regularizadas junto à ANVISA/MS, ou formas alternativas descritas na literatura desde que permitam a avaliação da precisão do sistema analítico.
A seleção dos materiais e dos respectivos fornecedores deve pautar em análises que envolvem custos, estabilidade do material, facilidades de uso, matriz, os analitos presentes no material e possibilidade de obtenção de um mesmo lote por grande período. A boa relação com o fornecedor e a previsão para o consumo de materiais ajudam no planejamento de fornecimento. A escolha dos materiais de controle deve fazer parte das estratégias traçadas no Planejamento da Qualidade do laboratório, e é importante evitar, sempre que possível, ampliar o número de materiais utilizados. O material de controle é uma referência importante para o controle do desempenho analítico e garantia de resultados precisos.
Em resumo, o controle interno da qualidade é uma parte fundamental do sistema da qualidade em um laboratório clínico. O material de controle desempenha um papel importante na garantia da qualidade dos resultados dos testes realizados pelo laboratório. É essencial seguir procedimentos recomendados para a estabilidade, reconstituição, fracionamento, processamento, descongelamento e condições de suporte, para garantir a consistência dos valores dos resultados de teste. Além disso, é importante considerar o efeito da matriz e escolher os fornecedores dentro do cumprimento das exigências para garantir a qualidade do material de controle utilizado.
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Além disso, o ebook explica de forma completa como utilizar os materiais de controle para monitorar os sistemas analíticos, bem como levantar os valores próprios de Média e Desvio Padrão do laboratório. Isso é fundamental para estabelecer limites de aceitabilidade para as análises de pacientes.
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Autoria:
Prof. Silvio de A. Basques
Frida Alves Basques